Fashion Law – Quando a Moda encontra o Direito

Vivenciamos a moda 24 horas por dia em nossas vidas. Ao levantar da cama, devemos nos vestir. Ao sair de casa, passamos por outdoors e vitrines cativantes nas ruas. Vemos anúncios em nossas revistas e sites favoritos. Mas o que a moda realmente significa? Entender esta questão é fundamental para entender o que torna as empresas de moda tão bem-sucedidas, e porque a lógica de negócios da moda é diferente do que qualquer outra indústria.


O filósofo Séneca, há 2000 anos atrás, escreveu: "Nós vivemos não de acordo com a razão, mas de acordo com a moda."De alguma forma, Séneca criou uma associação entre moda e emoções. Moda não é apenas sobre a funcionalidade. Nós não vestimos-nos apenas porque precisamos: compramos moda, porque assim a desejamos. Todas as manhãs acordamos e olhamos para o armário. Apesar de estar cheio de roupas, quantos de nós sentimos que não temos absolutamente nada para vestir? Graças a Séneca entendemos que isto é porque moda é sobre impulso e desejo.


Obsolescência planejada. Empresas de moda conseguem persuadir-nos a comprar novos produtos a cada seis meses, porque eles são capazes de associar a ideia de mudança não para o uso físico do produto, mas para a ideia de que a estética deve variar de acordo com a nova temporada. Isso é porque há uma estética nova e nós devemos expressar nossa personalidade de uma maneira diferente. O encurtamento artificial do ciclo de vida do produto é o que explica porque as empresas de moda são capazes de vender mais e vender melhor do que outras indústrias. Assim, conseguem ter um aumento de suas receitas e rentabilidade no curto prazo e do valor da marca no longo prazo.


Segundo a Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), oBrasil é o quarto maior parque produtivo de confecção do mundo; o quinto maior produtor têxtil do mundo e o quarto maior produtor de malhas do mundo. Autossuficiente na produção de algodão, o Brasil produz 9,4 bilhões de peças confeccionadas ao ano (destas, cerca de 5,3 bilhões em peças de vestuário), sendo referência mundial em design de moda praia, jeanswear ehomewear, tendo crescido também nos segmentos de fitnesse lingerie.


A indústria têxtil brasileira hoje é a segunda maior empregadora da indústria de transformação no país, com 5 milhões de empregados diretos e 8 milhões se adicionarmos os indiretos (dos quais 75% são de mão de obra feminina); perdendo apenas para alimentos e bebidas (juntos).


Porém moda não é apenas roupa, e por sinal, nem todas as roupas estão na moda. "Moda não é algo que existe apenas em vestidos. A moda está no céu, na rua, a moda tem a ver com ideias, a maneira como vivemos, o que está acontecendo ". Coco Chanel entendeu que a moda como uma lógica de negócios é um tratamento que pode ser aplicado a muitas indústrias diferentes, empregando estas tendências sazonais para muitas outras categorias de produtos.


Hoje as empresas de moda vendem fragrâncias, roupas de cama, mesa e banho, bolsas, óculos, relógios, sapatos e joias. Mais e mais, não só vendem produtos, vendem experiências. Assim abrem hotéis, clubes, spa’s e muitos outros negócios diferentes. A possibilidade de estender a marca em muitas categorias é o que torna essas empresas muito rentáveis.

Diante deste mercado expressivo, não há como renegar a necessidade de uma proteção específica a este setor.Em 2010, a Fordham University, nos Estados Unidos, foi a primeira universidade a difundir os conceitos de Fashion Law ou Direito Da Moda, através dos esforços da professora Susan Scafidi. No Brasil, com o crescimento dos conflitos no setor e a necessidade de proteção das criações, os profissionais do direito e as instituições de ensino passaram a se dedicar ao seu estudo de forma mais intensa, e em Santa Catarina a Univali foi pioneira ao lançar, em 2017, a Pós-Graduação em Propriedade Intelectual com ênfase no Direito da Moda.


O universo da moda comporta um número enorme de relações e contratos. Citamos de forma exemplificada o licenciamento de bens de propriedade intelectual, franquias, comércio internacional, importações, exportações, contrato de fornecimento de produtos, contrato de transporte, modeling, co-branding, licenciamento de direitos pertencentes a pessoas físicas, como direitos de imagem, voz, assinatura e nome. Temos também as relações imobiliárias, com shoppings centers, além do e-commerce, direito digital e do consumidor. As relações trabalhistas comumente geram uma infinidade de inquietações, somados aiminente mudança com a nova proposta de lei de regulamentação de terceirizações. Até o direito ambiental toma corpo com a presença de novos materiais e tecidos que comportam elementos químicos específicos e altamente tecnológicos.


Atualmente, um desafio muito importante para as empresas de moda é, por um lado, construir seu próprio estilo, único e reconhecível. Elas precisam ter uma personalidade, elas precisam ter alguma causa estilística que os clientes sempre possam associar com a marca; por outro lado, a fim de permanecer na moda, elas precisam do estilo para evoluir. O desafio é ser capaz de adaptar e filtrar as tendências em seus próprios olhos, em toda a sua própria personalidade.

Para que a empresa esteja “na moda”, é preciso ser contemporânea, relevante para os consumidores eé no campo da criação que surgem as disputas entre marcas e estilistas.


Por ser uma expressão ou esforço intelectual, esses produtos ou serviços necessitam de proteção, seja pelo valor mental e financeiro dedicado ao atingimento de certas soluções e processos produtivos, por exemplo, como tecnologias aplicadas a máquinas de costura, de tinturaria, de estamparia, seja pela proteção à marca, ao nome do criador associado ao objeto da moda ou a autoria dos traços de um croqui.


Por Frederica Richter


Frederica Richter é catarinense, advogada e sócia da Timmermans Advogados, empresa de Itajaí (SC) que atua com Direito Empresarial. Bacharel em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí, realizou diversos cursos de Propriedade Intelectual pelo INPI e WIPO, onde agregou conhecimentos sobre Direitos Autorais, Patentes, Marcas, Indicações Geográficas, Desenhos Industriais, Concorrência Desleal, Informação Tecnológica, Contratos de Tecnologia e Tratados Internacionais. Também cursou Fashion Law (Direito da Moda) na Escola Superior de Advocacia de São Paulo, Direito da Mídia pela Fundação Getúlio Vargas e em 2017 concluiu “Management of Fashion and Luxury Companies”, curso oferecido pelo(a) Universidade Luigi Bocconi, de Milão.



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